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A intensa vida de Evita depois de morta

26 jul

 

“La Argentina es un cuerpo de mujer que está embalsamado” ( Tomáz Eloy Martinez)

Hoje fazem exatos 58 anos da morte de Evita Perón. Como os pôsteres de Gardel, estou acostumando- me a conviver com suas imagens espalhadas pela cidade. E, não vou omitir, quando vim morar aqui fui até o mausoléu da Família Duarte, no cemitério da Recoleta, onde está sepultada, para pedir passagem.  Disse: “Essa cidade já foi tua, agora é minha!”. Estou aos poucos entranhando a megalomania argentina? Não! Mas, confesso que precisava de sua bênção. Temos ambições diferentes para esta cidade, a dela era encontrar um príncipe ou presidente, a minha é ser feliz, com ou sem príncipe/presidente.

Quando se aproxima uma data comemorativa, como a de hoje, aproveito para me educar um pouco e, uma boa maneira de fazer isso, é escrever. Conheço ainda pouco sobre sua vida. Até agora, li apenas um livro sobre Eva Perón. Era um relato insólito e magistralmente escrito sobre – pasmem – seu corpo!  Evita viveu certamente uma vida fascinante. Ao lado um dos homens mais importantes da historia argentina, General Juan Domingo Perón, foi amada pelo povo até sua morte no dia 26 de julho de 1952. Pipocam anedotas de sua tenacidade, dignidade, teimosia lendária e paixão pelo povo. Com o pouco que sei, seria impossível fazer um julgamento político de sua gestão.

 

Norma Shearer: Evita era fan

Dizem que sua mãe fora literalmente comprada por seu pai por uma carroça e um jumento. 

Posteriormente, retornando a sua esposa legitima.  E que teve uma infância pobre e fora escorraçada junto a sua família do enterro do pai por sua condição de bastarda.  Afirmava aos quatro ventos no povoado de Junín, onde vivia, que só se casaria com um príncipe ou um presidente e era fanática pela atriz canadense Norma Shearer. Com apenas 15 anos, foi viver na capital sob o proteção de Agustín Magaldi, considerado então uma espécie de Gardel do interior do País. Nove anos depois, conhece Perón, então vice-presidente.  

De desconhecida a imortal: 7 anos

De totalmente anônima, como uma muchachita de pueblo qualquer, a sua morte aos 33 anos de câncer no útero, como uma das mulheres mais adoradas do continente, passaram-se apenas sete anos.  É difícil separar a mulher do mito.Buenos Aires está impregnada de estórias sobre ela. Todos gostam de romantizar um pouco. Eu gosto de romantizar-la.

Era atriz. Ficção ou realidade, tornou-se a mãe dos “descamisados” a deusa dos desvalidos, a mãe precoce e loira de uma nação órfã de seus pais coloniais.

Sua vida foi, inegavelmente, intensa. Mas, teve uma morte ainda mais agitada. Sua vida depois de morta, e não sua biografia ao lado de Juan Domingo Perón, é tema do livro Santa Evita, publicado em 1995, pelo recém falecido mestre da literatura argentina, Tomáz Elóy Martinez. Ela não conheceu descanso até quase 16 anos depois de sua morte. Vitima de loucos, necrófilos, tramas políticas e dramas pessoais, o paradeiro do corpo de Eva Perón foi, por muito tempo, um dos maiores segredos argentinos. Conta Martinez que tamanha era a desinformação a cerca de seu destino que até sua mãe morreu sem saber onde estava, mesmo depois de anos percorrendo repartições do governo. “El cadáver de Evita es el primer desaparecido de la historia argentina. Durante 15 años nadie supo en dónde estaba. El drama fue tan grande que su madre (Juana Ibarguren) clamaba de despacho en despacho pidiendo que se lo devolvieran. Y murió en 1970 sin poder averiguar nada. No sabía -nadie o casi nadie lo sabía- si la habían incinerado, si lo habían fondeado en el fondo del Río de la Plata. Si la habían enterrado en Europa…

 

Pedro Aro assiste atonito ao sequestro de sua obra

Foi no dia 23 de novembro de 1955 que um perturbado senhor da inteligência argentina, diante da presença atônita de Pedro Aro, médico que embalsamou a primeira dama como se fosse um faraó egípcio, levou da sede da CGT da Argentina o corpo de Evita

 Descumprindo as ordens do presidente Pedro Eugenio Aramburu, que lhe ordenou que desse ao cadáver uma saudável sepultura, o tenente coronel Carlos Moori Koenig inexplicavelmente submete então Evita a uma peregrinação a bordo de um furgão, de uma floricultura,  por quase meia Buenos Aires. Era o começo de um calvário lúgubre, com nuances oníricas e macabras que chocaria o mundo. É impossível narrar aqui o pobre trajeto que Eva Perón é submetida depois de morta. Um símbolo do Peronismo, seu corpo era demasiado pesado para um governo que tentava se desfazer da presença de Perón.

Como  todo governo militar, tirano e desestruturado, não havia um plano. Evita é depositada em um prédio da Marinha e posteriormente levada por Koening  a sua casa onde é exibida como um souvenir do peronismo a seus convidados. Na casa oficial logo abaixo de Koening, Arandía, Evita foi testemunha de mais uma tragédia: crendo ser vítima de um ataque peronista para o resgate do corpo da primeira dama, Arandía assassina sua mulher grávida. Um show de horrores que só terminaria quase duas décadas depois, em Madrid.

Conte Biancamano

Como a igreja nunca pode abster-se de meter as mãos nas operações políticas mais obscuras e moralmente questionáveis da história humana, foi ela a encarregada de ajudar no “brilhante plano” de enterrar Eva Perón sob um nome falso na Itália. Com a ajuda magnânima da instituição, o corpo é traslado a Milão. Evita empreende então mais uma viagem a bordo do navio “Conte Biancamano”, com destino a Genova.

María Maggi de Magistri é nome sob o qual María Eva Duarte de Perón é enterrada no principal cemitério de Milão. Giussepina Airoldi é a graça da senhorinha que por 14 anos, religiosamente e inadvertidamente, levou flores ao túmulo de “uma bondosa mulher italiana que morreu na Argentina, em um acidente automobilístico, e que desejava ser enterrada em sua terra natal”. Permitam-me um adendo, mas ditaduras são incrivelmente equipadas por figuras insólitas com idéias distorcidas sobre a dignidade humana.

Aramburu: Nem Evita pode salvar-lo

No entanto, a odisséia da primeira dama estava longe de um fim, entre os outros capítulos de esta novela quase inverossímil,  quase vira moeda de troca no seqüestro do presidente Aramburu, quando é levado por radicais da esquerda ( Montoneros) em 1965. Mas, não chega a salvar-lhe a vida. É então requisitada para que se devolvesse, posteriormente, o cadáver do militar. Mas, é só em 1971 que seu cadáver é devolvido a Perón, na Espanha. Levaria ainda mais cinco anos para chegar ao seu país natal, sendo recebido pela terceira esposa de Perón, Isabelita, que na ausência de seu marido já morto, a devolveu a família Duarte.

Martinez: "A Argentina é um corpo de mulher embalsamado"

Sobre a incrível saga argentina nos meandros da odisséia do mundo, deixo as palavras de Martinez. Uma argentina que devora a si mesma com seus cadáveres embalsamados no armário, um país com um passado sobrehumano, superhumano e quase inverossímil.

Parece que en la Argentina hubiera como una especie de instinto fatal de destrucción, de devoración de las propias entrañas. Una veneración de la muerte.La muerte no signiflca el pasado. Es el pasado congelado, no significa una resurrección de la memoria, representa sólo la veneración del cuerpo del muerto. La veneración de ese residuo es una especie de ancla. Y por eso los argentinos somos incapaces de construirnos un futuro, puesto que estamos anclados en un cuerpo. La memoria es leve, no pesa. Pero el cuerpo sí. La Argentina es un cuerpo de mujer que está embalsamado”.

Argentina, a rainha do deserto

15 jul

 

Vigilia na frente do Congresso

Nos últimos dias só se falavam de duas coisas na Argentina: a onda de frio que invadiu o país e a tramitação da lei que aprova o casamento de pessoas do mesmo sexo no país. E foi sob este frio polar que milhares de pessoas enfrentaram a madrugada de ontem de temperaturas quase negativas para acompanhar em frente ao Congresso da nação a votação da lei que dava equidade de direitos ao matrimonio de homossexuais.

Aprovada!

As quatro da manhã veio o veredito do Senado: 33 senadores  a favor, 27 contra e 3 abstenções transformaram a Argentina no primeiro país da América Latina a legalizar o casamento homossexual. O dia 15 de julho é uma data história na luta por igualdade de direitos de gays e lésbicas por aqui. Agora, só falta a presidente do país, Cristina Kirchner, que é abertamente a favor do matrimonio gay, sancionar a lei. Foi incrível acompanhar também o apoio heterossexual á campanha dos homossexuais. Com todos os taxistas que conversei, por mais humildes que me pareceram suas raízes, estavam de acordo com a aprovação da lei. Meus amigos mais machões, as pessoas menos esclarecidas, já pareciam reconhecer uma realidade que chegou para ficar: nós heterossexuais não temos que meter o bedelho na vida amorosa dos outros.

Festa no Congresso!

A retrógada Igreja do país terá que “chupar esta manga arco-íris” e dar por fracassados seus esforços de mostrar a nova lei como uma dissolução dos valores de família. Durante meses, as associações de direito homossexuais agüentaram dignamente debates regionais e nacionais que os tachavam de doentes, anormais, aberrações e outros absurdos que só uma instituição retrógrada e reacionária como é a igreja sul-americana é capaz de verbalizar. Na noite anterior a votação, gente de todo país ( como de Mendoza, 14 horas daqui) veio expressar sua ignorância e intolerância graças a convocatória da igreja. Isso, fez com que me fugisse a explicação lógica de porque, em pleno inverno glacial, alguém enfrentaria uma viagem de 14 horas para expressar seu ódio.

O argumento de que o Estado deve dar condições iguais aos seus cidadãos, independente de suas preferências pessoais, prevaleceu na noite de ontem em cima daqueles que tachavam a nova lei de uma permissividade imoral.  Faço aqui um adendo que, para mim, imoralidade é a pedofilia velada que a igreja vem permitindo desde seus primórdios contra vítimas silenciosas ou silenciadas ao largo da história de suas instituições.

Madruga histórica

Falta agora o resto das nações sul-americanas passarem por cima de seu machismo e moralismo histórico e seguirem o exemplo da Argentina que, dessa vez, saiu na frente. É preciso acabar com essa inquisição contra uma situação que está mais do que consolidada. Ninguém vai deixar de amar porque não pode se casar e nem de adotar porque não vem de uma união de pessoas de sexos distintos. Vítima de caudilhos, ditaduras, expropriação sucessiva, roubos coloniais e ingerências histórias, a América Latina só não pode ser vítima de sua própria ignorância.   Muy bien Argentina, neste deserto a Rainha é você!

Santa Ignorância!

14 jul

 

“Será que nunca faremos

Santa Ignorancia senhor, dai-me paciencia.

Senão confirmar

A incompetência

Da América católica

Que sempre precisará

De ridículos tiranos

Será, será, que será?

Que será, que será? “(Caetano)

São lamentáveis as imagens que ficam repetindo os canais de televisão argentinos nesta gélida noite de terça-feira. Convocados pela igreja mais 70 mil manifestantes se reúnem em frente ao Congresso argentino para exprimir sua opinião contra a aprovação do matrimonio de pessoas do mesmo sexo que será votado neste domingo pelo Senado deste país. Ecos do retrógrado discurso das Igrejas católica e evangélica se escutam na Capital esta noite.

Pai, perdoai-os; eles não sabem o que fazem"!

Opiniões intolerantes, dogmáticas, descontextualizadas e reacionárias ganham espaço nos tele jornais argentinos. É um show de retrocesso, um pesadelo que faz lembrar os piores capítulos de um livro de Eduardo Galeano, as mais visionárias canções de Caetano. A Igreja sul-americana mostra mais uma vez que perdeu o trem para o século XXI e porque nosso quinhão do mundo não consegue superar as piores heranças coloniais. Uma igreja alvejada por estilhaços de pedofilia se crê mais uma vez o verdugo das novas idéias de igualdade. Tomara que a igreja argentina tenha que comer sua hipocrisia asada na parrilla no domingo e que este canto do mundo se mostre bem mais moderno e tolerante do que esperam que sejamos!

A reação da lado branco da força já começou no Obelisco! Como diria Fito Paez : “Quien dijo que todo está perdido…”

Todos Putos*

12 jul

* Puto é o termo argentino para viado, gay.

O clima está esquentando. As vésperas da votação final no Senado argentino, a igreja convocou uma grande manifestação contra a legalização do matrimonio entre pessoas do mesmo sexo no país. Se aprovada, a Argentina sairá na frente no quesito tolerância em relação a todos os demais países da América latina. Para entender melhor este processo leia o excelente artigo que escreveu hoje meu amigo, colega de profissão e co habitante desta cidade querida, Mauricio Boff, sobre o assunto AQUI!!!!!

Vale a pena entender e vislumbrar um pouco da ignorância da igreja neste tema que, como o universo, é infinita!E torcer para que os hermanos que, não ganharam a Copa, mas podem ganhar esta batalha!

* detalhe: a seleçao brasileira se abraçando debaixo do título “Todos Putos”, vamos levar na esportiva vai…